Cortes no orçamento público destinado a ciência e tecnologia no Brasil têm sido recorrentes nos últimos anos. Mas, afinal, como é composto esse orçamento e por que a redução dele impacta de forma tão negativa no desenvolvimento do país? Para discutir esse assunto, o USP Analisa exibe uma entrevista especial em dois programas a partir desta semana, com o coordenador do Instituto de Estudos Avançados Polo Ribeirão Preto da USP, Antônio José da Costa Filho e com o repórter especial da superintendência de Comunicação Social da USP Herton Escobar.
Eles explicam que, tanto no Brasil quanto em outros países, o dinheiro para financiar ciência e tecnologia não vem exclusivamente do poder público, mas em grande parte, principalmente para custear a chamada ciência básica. “A partir do momento que você começa a trabalhar com uma ciência mais aplicada, voltada para o desenvolvimento de produtos e tecnologias, para o mercado, aí você passa a ter um interesse da iniciativa privada em financiar esse tipo de pesquisa”, diz Herton.
Os recursos são divididos entre gastos obrigatórios, voltados para o pagamento de salários e outras despesas obrigatórias, e os chamados gastos discricionários, que as instituições decidem como devem gastar e que incluem o dinheiro para pesquisa e para o pagamento de bolsas a estudantes de graduação e pós-graduação, indispensáveis à produção científica.
“É importante lembrar que o recurso vindo das agências de fomento, como CNPq, Capes e fundações de amparo à pesquisa dos Estados, e distribuído através de editais ou de chamadas para um determinado tema ou modalidade de financiamento não é usado para pagamento de salários das universidades ou dos institutos de pesquisa. Esse dinheiro vem para financiamento da pesquisa. Muitas vezes, incluem bolsas de estudos que pagam os pós-graduandos, pós-doutores, mas não pagam docentes e funcionários da universidade”, ressalta Costa.
Outro importante componente do orçamento voltado a ciência e tecnologia é o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, o FNDCT. Herton explica que seus recursos não vêm do orçamento federal, mas sim de grandes setores econômicos, para que esses investimentos retornem em pesquisas de interesse desses setores.
“Esse fundo tem cerca de 8 ou 9 bilhões de reais, são recursos que deveriam estar sendo distribuídos para projetos de pesquisa e bolsas no país todo. Seria um recurso adicional ao orçamento, mas como o orçamento tá muito pequeno, o FNDCT virou um bote salva-vidas. Por isso que existe uma esperança, uma necessidade muito grande em liberar esse recurso. O problema é que o governo tem, nos últimos anos, contingenciado, ou seja, congelado, a maior parte desses recursos. Este ano é de 90%. Você tem o fundo, o fundo foi feito para financiar pesquisa, mas o governo vai lá e fala não, a situação econômica tá muito difícil, a gente não tem dinheiro, então vamos liberar só 10% do fundo para vocês e os outros 90% ficam em caixa para fazer superávit primário”, diz ele.
Costa alerta que essa situação de incerteza em relação ao financiamento da ciência no Brasil gera não apenas uma fuga de cérebros, mas até mesmo uma desistência da carreira científica, o que é uma perda incalculável para o país.
“Se as pessoas desistem de fazer ciência, de produzir conhecimento aqui no nosso país e ou vão para outro ramo da atividade econômica ou vão embora, como está acontecendo, isso não volta do dia para a noite. Esse tipo de investimento foi feito por anos, você demora dez anos para formar uma pessoa altamente qualificada para fazer ciência, aí em dez meses você perde um monte dessas pessoas. Como é que você repõe isso? Não repõe, não acontece do dia para noite. Você vê os estudantes desestimulados porque não tem expectativa futura, há falta de bolsas, falta de recursos para os projetos e o cara pensa: não vou entrar na pós-graduação, para que eu vou fazer pós-graduação? Essa é uma perda incalculável”, lamenta ele.
A primeira parte da entrevista vai ao ar nesta quarta (24), a partir das 18h05, com reapresentação no domingo (28), às 11h30. O programa também pode ser ouvido pelas plataformas de áudio iTunes e Spotify.
O USP Analisa é uma produção conjunta do Instituto de Estudos Avançados Polo Ribeirão Preto (IEA-RP) da USP e da Rádio USP Ribeirão Preto. Para saber mais novidades sobre o programa e outras atividades do IEA-RP, inscreva-se em nosso canal no Telegram.