Proposições de avanços concretos em temas como financiamento, qualidade das práticas pedagógicas, melhorias na geração e uso de dados para a implementação de políticas públicas com qualidade na Educação Infantil, além do papel do regime de colaboração na implementação das normativas para a Educação Infantil foram destaque na programação do 2º Simpósio Internacional de Educação Infantil. O evento, que teve entre os organizadores a Cátedra Sérgio Henrique Ferreira, do Instituto de Estudos Avançados Polo Ribeirão Preto da USP, e a Fundação Bracell, reuniu pesquisadores, gestores e nomes de referência no debate sobre políticas públicas educacionais para a primeira infância no dia 7 de outubro.
“Estamos reunidos para debater um tema da maior importância para o desenvolvimento do país, que precisa ser priorizado. A gente tem que falar de infraestrutura, de ter professores com formação adequada, garantir experiências de desenvolvimento e aprendizagem junto com o brincar, avaliar para podermos entender como estamos conseguindo fazer as crianças se desenvolverem e como avançar na qualidade”, afirmou Eduardo de Campos Queiroz, diretor-presidente da Fundação Bracell.
“O acesso de qualidade à creche e à pré-escola tem papel crucial na redução de desigualdades, por isso o compromisso com esta etapa é também condição indispensável para uma sociedade mais próspera. Não obstante os avanços ao longo de duas últimas décadas, ainda temos uma estrada pela frente”, defendeu o titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira do Instituto de Estudos Avançados Polo Ribeirão Preto da USP, Mozart Neves Ramos. “Esse foi um dia extremamente importante, e não pode terminar aqui, vamos trabalhar muito para elaborar políticas públicas, fazer articulação estratégica para ganhar capilaridade e levar para a ponta, para cada escola, uma Educação Infantil de qualidade.”
Cerca de 400 pessoas acompanharam o evento presencialmente, no auditório do Centro de Difusão Internacional da USP no Butantã, e mais de 700 visualizações foram contabilizadas no link da transmissão ao vivo. O evento é fruto de uma parceria entre a Fundação Bracell, o Ministério da Educação (MEC), o Unicef, a Cátedra Sérgio Henrique Ferreira, a Fundação Van Leer, o Itaú Social, e o David Rockfeller Center for Latin American Studies de Harvard em São Paulo.

Entre os palestrantes e debatedores estiveram também Dana McCoy, professora associada de Desenvolvimento Humano e Educação Urbana e co-presidente do Programa de Desenvolvimento Humano e Educação (HDE) da Harvard Graduate School of Education, e Susan Furhman, professora Emérita da Universidade de Columbia, além de representantes do MEC, Unicef, Inep, entre outros.
Qualidade da educação infantil tem impacto abrangente
Segundo Dana, muitos estudos comprovam a importância do investimento na primeira infância, período no qual são desenvolvidas habilidades fundamentais e repertório que fará a diferença ao longo de toda a vida da criança. “Sabemos que, com estímulos corretos e interações de qualidade em relacionamentos acolhedores, é possível catalisar o desenvolvimento infantil. Isso aumenta as chances de aprendizagem por toda a vida, traz retornos em saúde geral e até mesmo econômicos, já que revisões mostram que a cada dólar investido na etapa podemos esperar entre oito e 22 dólares de retorno”, compartilhou.
“E não estamos falando apenas de habilidades acadêmicas, temos que olhar a criança como um todo, promover o desenvolvimento integral, apoiar a regular emoções, lidar com os outros, ter curiosidade, criatividade, refletir sobre sua identidade e sua perspectiva sobre o mundo”, defendeu. “Precisamos de uma abordagem mais equilibrada, não só focada em letramento e numeramento, e fazer mais estudos sobre quais intervenções e métodos promovem a aprendizagem e, ao mesmo tempo, essas outras habilidades de forma mais abrangente, entendendo melhor como as estratégias podem ser amplificadas ter efeitos mais sustentáveis a longo prazo”.
Para o diretor de políticas e diretrizes da Educação Integral Básica do MEC, Alexsandro Santos, é preciso desenhar planos de expansão de acesso e de melhoria da qualidade da Educação Infantil em todos os municípios, algo previsto no Compromisso Nacional pela Qualidade e Equidade na Educação Infantil (Conaquei). “O Brasil tem melhorado a qualidade, mas ainda numa velocidade insuficiente para aquilo que nossas crianças merecem e para consolidar a democracia, pois não há país justo se a educação infantil não tem qualidade.”
Regime de colaboração deve contribuir com a Educação Infantil
Na última mesa do dia, Mozart Neves Ramos mediou apresentações sobre a importância do regime de colaboração. Lembrando que boa parte dos 5.569 municípios do Brasil é de pequeno porte, com baixa capacidade técnica e financeira para implementar as medidas debatidas no Simpósio, Mozart reforçou que é preciso um processo de articulação com os estados e a União. “O regime de colaboração está previsto em um dos mais belos artigos da Constituição Federal, o 205, e é absolutamente estratégico para a qualidade da educação como um todo. A gente não tem um regime colaborativo se não tiver os estados também presentes e oferecendo seu apoio, senão fica um hiato”, disse Mozart.
Representando o Fórum Nacional dos Conselhos Estaduais e Distritais de Educação (Foncede), Celi Correa Neres, presidenta do Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso do Sul, reforçou que o Conaquei já prevê que seja realizada a revisão e atualização das normativas da qualidade na Educação Infantil, inclusive pelos estados, que devem também regulamentar profissionais como parte da rede nacional de implementação dos parâmetros de qualidade.
“Há municípios que não têm sistemas municipais de educação, e que estão sujeitos às normativas dos estados. Em Mato Grosso do Sul são 79 municípios, mas apenas 45 conselhos municipais, nos demais a responsabilidade é do conselho estadual. Este órgão colegiado atua para regular, fiscalizar, propor e autorizar deliberações dos sistemas de ensino, formular políticas educacionais e avaliar a execução de planos de educação”, explicou. “O trabalho nos conselhos é exatamente constituir rede de colaboração com entes federados, e é urgente propor orientações práticas para uma Educação Infantil realmente equitativa e inclusiva. No levantamento do Foncede, por enquanto apenas o Mato Grosso do Sul já implementou parecer para normatização dos parâmetros de qualidade. Outros estão montando comissão para elaboração da norma de orientação.”
O Conaquei possui diferentes frentes de atuação, e propõe um modelo de governança colaborativa, por meio do qual, entre outros pontos, os estados também são convidados a criar planos de apoio aos municípios para melhoria da qualidade da Educação Infantil, além de indicar representantes para a rede nacional de Educação Infantil que deve ser instaurada em novembro.
“Desde a resolução do Conselho Nacional de Educação de 17 de outubro de 2024, que estabeleceu as diretrizes operacionais de qualidade e equidade para a educação infantil, todos os sistemas de educação têm obrigação de atualizar suas normativas à luz deste documento”, lembrou Rita Coelho, coordenadora geral de Educação Infantil do MEC. “Mas temos conselhos em que a normativa ainda é de 2004. Outros não fazem menção clara a aspectos relevantes, como o número de crianças por turma e por professor e na definição do papel de outros profissionais de educação, como os auxiliares. Isso tem que ser encarado e demanda uma posição clara sobre a docência na Educação Infantil. Precisamos de todos para a implementação do Conaquei.”


